domingo, 12 de setembro de 2010

Blasé

"Você é tão blasé!" disse ela ao descer do carro soltando o El Niño pelas ventas. Carlos não sabia exatamente o motivo de tanta irritação de sua companheira, não sabia sequer o que significava ser um cara blasé. Enquanto refletia sobre as possibilidades que, julgava terem algo a ver com o ataque histérico de Julia, ele viu do outro lado um senhor que já passeava pelos longínquos territórios da sexagenariedade. Carlos saiu do carro e foi ao encontro do velho homem, que sentado nas escadas que antecediam a porta principal de uma casa - provavelmente de sua posse - tranquilamente girando entre os dedos um caule seco de alguma flor do jardim que rodeava o espaço entre o meio fio e a porta. "Boa noite" cumprimentou Carlos estendendo a mão. "Boa noite meu filho" respondeu cordialmente o velho homem atendendo ao gesto. "Posso me sentar com o senhor? Ah perdão, me chamo Carlos por sinal". O velho homem balançou a cabeça, não se sabe se positivamente, pois não foi um movimento muito nítido, e então disse "Minha graça é Franz. E pode sentar sim, fique a vontade, mas não lhe garanto conforto, afinal não costumo receber visitas do lado de fora de minha casa." Carlos sorriu e sentou-se. Olhou para a casa de Julia e viu a janela de seu quarto acesa. Apontou para a janela e disse "Minha garota mora nesta casa, e aquela luz vem do seu quarto". Franz levantou o olhar para conseguir ver para onde o jovem apontava e perguntou "Por que então você não está lá, com ela?". Carlos respondeu "Na verdade não sei. Mas gostaria que o senhor pudesse me esclarecer algumas coisas. Não entendo as mulheres! Não adiantaria ser perfeito, elas não ficariam satisfeitas nem assim". Seu Franz riu alto de forma que sua ligeira gargalhada chegasse a ecoar pela rua deserta ajudada pelo fato de já ser tarde da noite. Presenteou Carlos com dois tapinhas no joelho e disse "Você acha sinceramente que estou sentado aqui, nas escadas do meu jardim às onze da noite, porque quero tomar um ventinho? Não meu jovem, não é por isso. Antes o fosse. Na atual conjuntura, estou começando a achar que ficar do lado de fora é até melhor. Elas (as mulheres) são assim mesmo, são uma sala lotada de gás onde a mínima faísca pode causar resultados catastróficos. Não adianta tentar entendê-las, não adianta tentar consertá-las, a vida as fez assim". Carlos olhou novamente para a janela de Julia e viu a luz se apagar. Voltou a atenção para Seu Franz e indagou "Pois é, tentar entender as mulheres é uma tarefa impossível. Mas eu queria entender pelo menos os xingamentos que elas utilizam. Hoje mesmo é ela (a Julia) me chamou de blasé! Que raios isso siginifica?" Franz levantou-se, descansou sua mão no ombro esquerdo de Carlos e disse "Quem liga? Elas leem tudo isso em alguma revista. O xingamento muda, porque a revista muda com o tempo, mas no final o recado é sempre o mesmo. Vai se acostumando, porque agora elas têm a internet, meu filho".        
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A obra Assunto Popular Brasileiro de Diogo Dias foi licenciada com uma Licença Creative Commons - Atribuição - Partilha nos Mesmos Termos 3.0 Não Adaptada