terça-feira, 30 de agosto de 2011

Afã

Fanatismo é uma palavra assustadora. Sinto algo parecido com claustrofobia - não sei dizer exatamente o que é - quando ouço ou leio esse verbete. Fico ainda mais aterrorizado com o apócope "fã". Ô coisinha minúscula e destruidora!

Quando alguém me diz que é fã de alguém, me preparo para uma tempestade passional de elogios e frases carinhosas. Nada de errado nisso. A não ser pelo fato de que o agraciado pelos afagos verbais não tem a mínima noção sequer de quais são as iniciais do seu admirador. As partes nunca se encontraram, e possivelmente nunca se encontrarão. Mas por alguns estímulos de ordem midiática, surge uma paixão unilateral. E o fã, coitado, prende-se na perfeição do ídolo. Quer ser igual. "...ou parecido. Já serve...".

O problema é que ídolos também são fãs. Assim o efeito dominó é desencadeado, encadeando cada vez mais as pessoas. Um é fã de outro que é ídolo de um. Mas sem drama eu compreendo tudo. Sejamos fãs de qualquer um, menos de nós mesmos. Porque de autogênios o mundo já está farto. Como dizia meu ídolo Fernando Pessoa: "...E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não podem haver tantos", não é verdade?


quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Logo Seca

Compreensão é dádiva escasseada nesse nosso mundo.
Não por falta de tentativas, tão pouco por excesso delas.
É que muito do que há e do que é
Foi feito para não compreender.
Nem desvendar, nem decifrar, nem entender.
Nem matutar, nem ganhar, nem perder.
Há coisa que há por haver.
Que é por ser.

Pede o perdão que já ali gastará em outro erro.
Percorre com passos medrosos o caminho que não conhece.
Mas já lá adiante sente como chão amigo.

Adianta afagar-te agora? Nessa maldita hora. Maldita por ser?
Vale lembrar-te que agora choras, mas que já já volta tua alegria de viver?
Nem ouso rabiscar resposta para o inquestionável mistério.
Procuro somente sentar-me ao seu lado à varanda
Balançando pensamentos
E sentir o vento
Secador de rostos úmidos.


quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Eu e Meus Poderes

Céus, como desejei ter poderes mágicos. Caçoar dos alquimistas por nunca conseguirem o que eu conseguiria. Transformar, teletransportar, desaparecer. Era tudo o que eu queria. Contudo, entendo as razões de não nos serem dignas tais facetas. Imagine só o que não fariam os cleptomaníacos, os tarados e os depressivos? Talvez não existisse mais a posse das coisas, nem castidade e muito menos depressivos. Mesmo eu não sei confiar-lhes como lidaria com meus instintos anti-éticos e imorais. Pense bem. Que possibilidades!

Supondo que houvesse uma regulamentação para o uso dos poderes, eu já abdicaria de tê-los. Fujo de regras. Além do quê, o bacana de se ter poderes é abusar. Exibir-se para milhares de olhos crédulos e ouvir ruídos onomatopéicos ao ver-me transformar, de repente, água em cerveja. Seria lindo, épico. E uma baita festa. Transformaria as figuras indesejadas em artigos decorativos, estátuas de cera, balas de canhão do século passado. Ou simplesmente me teletransportaria para outra festa, em algum lugar quente abaixo da Linha do Equador.  

Por essas e outras é que nós, os homens, não temos poderes. Temos deveres.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

De Domingo a Domingo

Encosta-te em mim, aqui juntinho
Sem medo, que eu não ataco sem avisar
Seu tecido no meu tecido
Faz vincos de você sem parar

Deita-te sobre mim
Toca seu nariz no meu
Corre tua mão em meus braços
Já debaixo dos panos

Levanta-te devagar sem pressa do mundo acabar
Que nada há lá fora que valha
O tempo que tenho para te gastar

Chama-me à cozinha gritando para fazer-lhe companhia
E a noite baixinho ao pé do meu ouvido
Que vou às ordens submisso, de domingo a domingo




terça-feira, 9 de agosto de 2011

Nada Faz Sentido

Entenda como quiser a aquilo que não faz sentido. Procurar sentido demora e desgasta. E nem ao menos o consolo de se poder achá-lo se tem. É comum que as coisas saiam de controle, que elas saltem serelepes para longe do alcance dos braços, para onde a voz não chega, livres de qualquer repreensão. Conformei-me com isso. E não o fiz agora. Há tempos entendi que sou mero instrumento. De cordas, de percussão, de sopro, de tudo. E o que sai é música que não preserva estilo. Da melancolia do tango à alegria desenfreada de um samba de carnaval. Depende se estou de cordas ou de sopro ou de percussão. E quem me toca? Sei que vibro e ressoo o que a pauta ao meu redor conduz. Nas mais diferentes claves, nas mais ricas melodias. Vivo as pausas. Vivo as notas. Semibreves. Não quero fazer sentido. Desejo apenas ecoar suavemente em seus ouvidos.

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

O que não sabem o que é

A barriga arde a quentura
Que sobe para as maçãs do rosto
Enchem as veias de plasma
Entorta estradas
Confunde morros
De prédios em casas
De tempos em tempos
Jogam-se sem tomar conhecimento
Do caráter fatal do mergulho,
Do momento.
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